Legalidade das Gravações de Áudio e Vídeo em Condomínios

Pode o condomínio gravar, além de imagens, os áudios dos eventos que estejam ao alcance das câmeras e dos microfones?

Entendo que as imagens, desde que retiradas de locais de uso comuns, são plenamente legais e podem registrar os acontecimentos dentro do condomínio, sendo uma possibilidade ligada ao dever de vigilância e registro de atos eventualmente ilícitos.

Por claro, não se pode filmar e gravar dentro de locais privados, como banheiros, saunas, vestiários, etc. Mas a gravação de vídeo em locais de circulação de pessoas, antes de um poder, é um dever da administração.

Como sabemos, as imagens gravadas são custodiadas pelo condomínio, não podendo ser franqueadas a qualquer pessoa, principalmente  quando na desejada gravação estiverem mais de uma pessoa.

Lembramos que imagens de pessoas não podem ser solicitadas por outras que não as ali gravadas, exatamente por respeito à privacidade, dentro das regras legais e constitucionais.

A finalidade de tais imagens é a investigação de eventuais atos ilícitos praticados, buscando a autoria. Desta forma, elas existem para que sejam requisitadas pela autoridade judicial ou policial.

Mas e o áudio vinculado a essas imagens? 

Não é necessário obter o áudio de uma pessoa para constatar o ato ilícito derivado de uma ação física. Mas um ato ilícito pode ser praticado com a voz, por lógico, como nos casos de ofensas morais, como difamação e injúria.

Com tal raciocínio, poderia afirmar que seria lícito gravar áudios de determinadas câmeras, a fim de fazer prova futura de ofensas, injúrias ou mesmo difamação.

Ocorre que, nas gravações de áudio, a privacidade se estende. O entendimento é o de que posso gravar um áudio onde sejam gravadas a minha própria voz e a do interlocutor. Se eu gravo um áudio, mesmo não autorizado pelo outro, mas quando eu mesmo estou nessa conversa, ela não é considerada ilegal.

Mas jamais posso usar uma gravação de um diálogo do qual eu não participe, pois é ato ilegal pela falta de autorização, além de ser uma prova imprestável. A justiça não tem aceitado gravações não autorizadas e feitas à revelia dos gravados, como, por exemplo, escutas telefônicas não regulares.

Uma câmera com microfone gravando áudio dentro da portaria ou da sala da administração, sem autorização dos que ali frequentam, é ato ilegal e até mesmo antiético, pois invade sobremaneira a privacidade.  E sequer uma assembleia, em meu sentir, pode autorizar tal função, até mesmo porque a circulação não é apenas de condôminos, mas de terceiros e outros que não estão sob o jugo da convenção ou das decisões em assembleia.

A constituição nos ensina, nesse sentido:  assegura como cláusula pétrea o respeito à vida privada, além da vedação ao uso de provas obtidas por meio ilícito.

Já a Lei 9.294/96, que trata diretamente do tema da escuta telefônica, fala de outro assunto: grampear uma comunicação, e aí já são outros recursos, bem mais sofisticados, de intercepção da voz, o que, em tese, acontece com a gravação de áudio por meio de câmeras. E quando se grava terceiros sem autorização, crime acontece.

A gravação de áudio em locais onde várias pessoas circulam e não necessariamente falam apenas com a administração ou com a figura do condomínio, se mostra uma nítida interceptação de áudio, ferindo a constituição e a lei especial.

Um dos argumentos que sustenta, pelos gestores de condomínios, a necessidade de gravar áudios é seu uso quando, exatamente, funcionários ou o próprio síndico são agredidos com palavras por condomínios ou terceiros, no que a gravação faria uma boa prova, já que, neste caso, o interessado é parte da conversa.

Mas para isso, hoje, podemos usar o próprio celular, nos momentos necessários, ou buscando testemunhas para confirmar tais agressões verbais. O circuito interno de câmeras não se presta a isso.

Não me parece correto ter áudio nas 24 horas do dia, ao bel dispor dos gestores, para escutar ‘pensamentos altos’ de quem frequenta tais locais, quando raramente se necessitaria de uma prova de agressões físicas.

Tais gravações não são autorizadas e nem poderiam ser pela assembleia – que não pode validar ilegalidades – e configuram grave invasão de privacidade com desrespeito às leis vigentes e, principalmente, ferindo a constituição.

Marcelo Alvarez Meirelles
Diretor Jurídico – Grupo ABRJ
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