Em tempos de pandemia, onde o interesse coletivo deve prevalecer ainda mais sobre as vontades individuais, muito se tem perguntado sobre a obrigação, legal ou não, de que moradores usem máscaras nas dependências dos condomínios, ou seja, na circulação pelas partes comuns dos prédios.
Antes de mais nada, devemos esclarecer que a administração interna poderia estabelecer regras para os entregadores, prestadores de serviços e funcionários, regras estas que sempre estariam sujeitas ao crivo assemblear, mas que, neste momento em que as reuniões estão vedadas, para se evitar aglomerações, são mesmo monocráticas, exigindo que estas terceiras pessoas apenas entrem nos condomínios com máscaras faciais.
Nada mais apropriado e dificilmente esta medida administrativa seria desprestigiada em uma assembleia, já que plenamente lógica e lúcida.
Mas, e quanto aos moradores? Podemos obrigá-los a usar máscaras nas partes comuns dos condomínios onde moram?
Os condôminos e moradores são, em regra, ‘donos’ das partes comuns, e, neste sentido, pode ser entendido que tais partes comuns são uma ‘extensão da residência’ e, com isso, não haver tal obrigação.
Há, para a cidade do Rio de Janeiro, duas normas cogentes e obrigatórias. A Lei Estadual 8859/2020, que obriga ao uso apenas em locais públicos e, nos privados, quando de uso comum.
Diz a referida lei, nesta parte:
Art. 1º – Torna obrigatório, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, enquanto vigorar o Estado de Calamidade Pública em virtude da pandemia do novo Coronavírus, o uso de máscara de proteção respiratória, seja ela descartável ou reutilizável, em qualquer ambiente público, assim como em ambientes privados de acesso coletivo.
§ 1º – Compreende-se entre os locais descritos no caput deste artigo, dentre outros: ruas, praças, parques, praias, meios de transporte coletivo e individual de passageiros, repartições públicas, hospitais, supermercados, farmácias, padarias, agências bancárias, além de outros estabelecimentos comerciais.
Fácil notar que a referida lei estadual não menciona as partes comuns de condomínios, embora fale de ‘ambientes privados de acesso coletivo’, mas, na descrição do seu primeiro parágrafo, não menciona os condomínios, até mesmo porque o ente estadual não tem legitimidade para legislar sobre propriedade, que é da esfera federal.Já o Decreto Municipal 47.282/2020, determina o uso de máscaras no âmbito do Município do Rio de Janeiro, limitado, por claro, ao alcance da legitimidade da prefeitura, como os bens públicos e os estabelecimentos em geral, onde o município pode alcançar por meio de licenças e alvarás. Mas, novamente, não pode o município legislar sobre a propriedade e, com isso, estão livres os condomínios para determinarem de que forma devem e querem estabelecer regras internas.
Diz o decreto:
Art. 1º-J Fica considerado obrigatório o uso de máscara facial não profissional durante o deslocamento de pessoas pelos bens públicos do Município e para o atendimento em estabelecimentos com funcionamento autorizado, em especial, para:
I – uso de meios de transporte público ou privado de passageiros;
II – desempenho de atividades laborais em ambientes compartilhados, nos setores público e privado;
§ 1º Para efeito do caput deste artigo, e em conformidade com o disposto no art. 99 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que institui o Código Civil, consideram-se bens públicos:
I – os de uso comum do povo, tais como lagoas, rios, mares, estradas, ruas e praças;
II – os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração pública, inclusive os de suas autarquias.
Novamente, não pode mencionar os condomínios o decreto municipal, como já mencionado, pela ausência de legitimidade em relação ao direito de propriedade.
Assim, não há no ordenamento jurídico, hoje, qualquer norma que exija o uso de máscaras por condôminos, exatamente em razão de serem os condomínios áreas privadas e, por isso mesmo, sujeitas às regras internas. Apenas uma mudança de regimento interno, o que pode ser feito por maioria simples em assembleia, pode determinar e obrigar o uso de máscaras faciais nas partes comuns de condomínios, exatamente em razão de ser o regimento uma lei interna de cumprimento absoluto, pena de multa a ser aplicada pela administração.
No mais, infelizmente, é contar com o bom senso dos moradores e condôminos.